O ATOR E O RETORNO DA MORTE

 

O ATOR E O RETORNO DA MORTE

COELHO DE MORAES

Instala-se (Freud) o conceito de pulsões. Pulsão de vida e pulsão de morte. Conceitos de origem nos campos do id – inconsciente – e se projetam ao longo da vida. Platão já dizia que Filosofia é uma preparação para a morte. A morte física? A morte com superação de etapas? A preparação para a morte do entendimento sensível (daquilo que se sente materialmente, tato e similares)? A entrada no campo metafísico ( o que vai além da física ou do físico – oi conceito de quanta será metafísico)? Mas Platão não gostava de teatro por não ter entendido o sentido da representação. Teorizou muito sobre música e já dizia que para dominar um povo basta dominar sua música. A partir dessa frase platônica, O que pensar da música – ou atitudes - importadas? Qualquer uma: rock, hiphop, sinfônicos alemães, óperas italianas... Teria que esperar Freud.

Essa morte prevista não é aquela dos filmes de terror nem das dos desenhos animados em qe uma panelada na testa desmonta a pessoa – personagem – para remontá-la logo em seguida. Trata-se do caminho natural de um corpo que tem história de começo/meio/fim, e, se direciona para este fim desde que nasce. A pulsão que busca o retorno à Natureza é TANATOS. Tanatos é idealização daquilo que é inarticulável em linguagem... daquilo que não dá para falar... O corpo humano que nasce/vive/morre busca voltar ao pó... homem/húmus/humanus/manus/mão/artífice... barro (aglomerado de átomos) de onde partiu aquele ser biológico que age e não pensa na conseqüência, fingindo que pensa. A propaganda da TV afirma que ele pensa e este humano acredita nisso piamente, mas, depois da panelada o ser humano desarticula sua memória.

O corpo biológico nascido de genótipo se torna fenótipo (que é a relação com mo meio ambiente), depois, ser social que interage com a civilização construída. Este corpo vai também construir a sua parte na civilização (mesmo que seja destruir). Interfere na civilização que herda ao nascer. Daí o mal-estar na civilização; inserir-se neste contexto não demandado mas, obrigatório ao nascer, não demandado, repito, é abdicar do estado natural segundo Rousseau. Sair do estado natural para um não-natural – civilização / kultur - é de negar seus mais escondidos desejos; é ser civilizado e cair num estado de mal-estar constante. Nostalgia do nada. Tristeza por coisa alguma. Bachianas nº2. Rebeldia sem causa. Ter saudade do momento que não viveu.

Assim subamos ao palco para reviver? Re-presentemos ou seja, colocamos de volta no presente aquilo que nos tocou? Lázaro redivivo? Quando Lázaro saiu da cova fedia à morte ou lavanda?

Ainda Freud: do binômio civilização-renúncia pulsional, como forma de constituição do laço social, diria respeito a uma forma universal de cultura; a defesa da concepção de cultura marcada pelo projeto iluminista-humanista do domínio da natureza pela razão; trata-se de falácia gigantesca, pois, enquanto o ser humano interfere na natureza (eufemismo para CONTROLA a natureza ) o ser humano altera seu status na própria Natureza, excluindo-se como item do equilíbrio ecológico. O ser humano é alienígena em seu próprio planeta ou será só alienígena?

O retorno ao estado natural do mundo será através da eliminação do ser humano como corpo estranho que causa a infecção. Deve ser extirpado.

O mundo é palco. A cultura é uma peça que se desenvolve nesse palco. Há muito improviso. Tem muita gente que nem percebe que atua.

Todas as observações acima se calam quando se recebe muito bem e se trabalha na Rede Bobo.

Quando atriz/ator irrompem no palco acabam por negar a pulsão de morte e revitalizam, através da personagem, a existência de uma nova história a ser contada, de uma nova bio, de uma nova zoe. Atriz/Ator rompem com o ciclo que leva à morte e rasgam o véu da neurose, desencadeando a catarse que se quer. A ficha que cai. A idéia que se propaga. A sensação de Eureka. Mas, apenas sensação.

Dois conceitos ainda a serem pensados e trabalhados: Antiédipo: quando a mulher assume seus papéis (que não fazia no começo do teatro) / e fim da pulsão de morte, mesmo que sobre o palco.

No palco negamos a morte e consideramos o eterno repetir. No entanto a cortina se fecha no final, mas se abre no momento seguinte. As cenas querem repetir o quotidiano ou o fato ou o evento, mas sempre repetir e por si só repete o mesmo de si, a cada dia de apresentação. No entanto, a cada dia de apresentação o repetido não é tão o mesmo. Tem pequenas mudanças.

Há na música minimalista tensões desse tipo. Pequenas células musicais que se organizam e mudam sempre; sempre alterando algo no ritmo, na ordem, na posição ou ainda no instrumento que toca o trecho. Se forem vários instrumentos teremos universalidade de informações.

Bob Wilson usa tal recurso em seu balé no teatro. Uma única coreografia que todos aprendem. Mas, como cada um dos cinqüenta executantes a realiza em momento diferente e em posição geográfica muito variada, iluminado por luzes diferentes a realização se torna caleidoscópica e multiplica a visualização com pequeno esforço. Sentimos que tudo é diferente.

Atriz/Ator repetem sua cena a cada dia. A cada dia a mesma cena muda. Um trejeito ali. Mudança no passo. Na velocidade da fala. A cada dia quem a vê a vê diferente, por ela (pela cena) e por si mesmo (pessoa pensante). A pessoa que vê a cena ganha, a cada dia, mais conteúdos e seu olhar muda sobre a cena. A repetição se dá dentro do episódio do acaso. A cena realinha os conteúdos da pessoa/platéia.

A peça civilizatória, ou o papel que a sociedade impõe e que a população assume é mal teatro. As peças sobre o palco tentam organizar a civilização, não com o fito de controlar a civilização, mas com interesse de esclarecer ou iluminar pontos – AUFKLARUNG. Quando a platéia se emociona é por que percebe que mal decorou o texto ou que mal improvisou, sempre fora do tempo ou do sentido. Começa que o DRAMA é o movimento da coisa e as pessoas se limitam a permanecer sentadas, imóveis, absorvendo sem participar. É a tradição reinstalada.