A (des)valorização do Ator

“O que você faz da vida?” - “Sou Ator” “Legal, mas você trabalha com o que?”.Que jogue a primeira pedra o ator que nunca passou por isso. Mas devemos olhar mais a fundo. Apesar de ter se tornado uma piada, essa e outras questões desse tipo são sinais graves da decadência da imagem de pessoas que, com árduo trabalho que os obriga a abrir mão de sua vida “normal”, estão se tornando cada vez mais “mal-vistas”.

Mas porque?

Há muito que a palavra “ator” foi banalizada, e está cada dia mais se tornando um adjetivo comum. Qualquer criatura que faça alguma figuração em uma novela de quinta, ou até mesmo o famoso teste de fidelidade do Joao Kleber, já se auto-entitula “Ator”, a mídia o chama de ator e, conseqüentemente, o POVO o chama de ator. Mas essa pessoa é um ator? Talvez. Mas a maioria não.

Voltando no tempo, para maior entendimento, vamos nos colocar nos anos entre 1900 e 1960, onde os atores eram deuses da cultura e do entretenimento na Terra. O teatro herdara das grandes óperas dos séc. XVIII e XIX o glamour e riqueza artística nas produções. Ser um ator significava ser uma estrela, mas, antes de mais nada, significava o fruto de muito estudo, trabalho e dedicação, ou seja, ser ator era algo digno, era uma profissão consagrada, pois todos sabiam que, a maioria daqueles que estavam ali nos palcos, trabalhavam duro, independente do estrelato.

Com o crescimento do cinema a situação do auge do teatro modificou. A maioria dos cines-teatros construídos nos primeiros dez anos do século passado, acabou por ignorar o palco, em favor da tela, e o teatro se abalou artisticamente.

Daí pra frente, vieram as TVs, e junto com elas, as novelas, os seriados, os comerciais, etc.

Chegamos então ao séc XXI, onde basta ter um rostinho bonito e um corpo “sarado” para ser chamado para uma novela ou reality show, ganhando assim automaticamente o título de “Ator”. A maioria, então, monta espetáculos ridículos que chegam a ser uma ofensa à arte (vide Sheila Carvalho, Gianechine(?), Dado Dolabella, etc, etc, etc). Os novos grupos e artistas do teatro passam por dificuldades financeiras e principalmente um desdém do governo que quer valorizar a cultura, mas esquece que o teatro DE QUALIDADE é a principal forma de se fazê-lo. Entra-se então em um assunto que iria causar mais páginas e páginas de lástima e desagrado: o teatro comercial. Mas melhor não falar.

É utópica a idéia de se recuperar o valor artístico do teatro. Isso acabou e dificilmente vai voltar aos bons tempos, pelo menos no Brasil. Os descendentes daqueles que no passado foram um enorme público teatral, já estão acostumados e viciados com a ignorância fútil da TV, e vêem o teatro como algo chato e sem graça. Por não conseguirem enxergar a grandiosidade filosófica e social passada ali com a energia de pessoas dedicadas e apaixonadas pela arte, o “novo-quase-público” ignora os palcos.

Hoje os artistas contam somente com eles mesmos, uma troca intelectual e cultural para manter viva a chama da arte cênica em meio a barbárie da sociedade moderna.